terça-feira, 16 de setembro de 2008

Fabric-Ado
Peter and Duchamps

Peter Paulo Vitor de Brito. Talvez muitos nomes para uma pessoa só. Mas é que Peter de Brito – aliás, nascido Pedro Paulo – é mesmo um artista multifacetado.

Sua obra, que está exposta na galeria Emma Thomas, dialoga com mestres como Duchamp, colocando em xeque a lógica da indústria da fama, e, enfim, a própria lógica capitalista do consumo desenfreado.

Uma das obras expostas é "Auto Retrato", famosas paródias de capas de revista, que já foram expostas em 2006 e deram o que falar. Nelas, Peter de Brito vira ele próprio a celebridade, transformando-se em diversos alter-egos como Paulo Grande, Vitória Littelstone – uma autora lésbica de poesia erótica - e a mais recorrente e enigmática, a figura Darcy Dias, personagem andrógino que lembra muito Rrose Selavy, alter-ego do francês Duchamp. Darcy Dias – nome masculino ou feminino?– aparece tanto na capa da Playbof (paródia da Playboy), quanto na capa da P (paródia da revista G). Esse personagem híbrido, às vezes homem, às vezes mulher, brinca com o conceito de gênero sexual – estanque na indústria cultural; dividido entre a "mocinha" representando as mulheres, e o "galã" representando os homens. Suas paródias subvertem a linha editorial de cada revista, causando humor ao nos revelar o quanto pode ser esquizofrênica a indústria cultural. Dessa forma, a "Vida Simples", uma revista de bem-estar e saúde, com pitadas de auto-ajuda, vira a macabra "Morte Simples", revista que fala de eutanásia, depressão, e de como aceitar a própria morte. Ou seja, uma revista que antes era sobre frescor e vitalidade, vira uma contestadora obra sobre um assunto pouco retratado, um dos maiores tabu da sociedade: a morte.

A revista "Noivas", vira a "Doidas" – publicação sobre a histeria feminina pelo casamento. Já a "Silicone & Lipo", paródia de revistas de plástica, traz uma ácida e hilária matéria: "Plástica no cérebro – bonita por dentro e por fora". Muitas outras pérolas poderão ser encontradas nas 25 capas de revistas, que demoraram cerca de 1 ano e 7 meses para ficarem prontas – uma vez que, além de trabalhosas, Peter também dedica muito de seu tempo como professor de educação física numa escola estadual em São Paulo.

Além das revistas, uma parte toda inédita de seu trabalho também estará exposta. "From Gastão to the world" é composta por sátiras à propagandas de roupas, acessórios e perfumes de grifes. O perfume Chanel vira "Chanal". Vemos uma reprodução perfeita de uma propaganda da Chanel, mas sabemos que é uma falsificação. Vemos uma modelo esbelta de pernas longilíneas e, embora tudo indique que é uma mulher, sabemos se tratar de um homem, o artista Peter de Brito. Suas propagandas nos fazem contestar o limite entre original e paródia. Um incômodo ruído é criado, pois não conseguimos definir esse limite. O cerne do objeto fetichizado pelo status de objeto de grife é, por tabela, contestado. Afinal, o que há de tão chocante e subversivo nas propagandas de Peter, que por mais que suas cópias sejam quase similares às originais, jamais passariam por elas?


Em outro exemplo, a marca LaCoste vira LaFonte, numa óbvia referência à revolucionária obra de Duchamp, "A Fonte"- obra polêmica até hoje, por se tratar por de um mictório assinado pelo artista francês. Naquela época, Duchamp queria redefinir os padrões de arte com seus readymades (objetos prontos conceitualizados pela visão inovadora que um artista poderia lhes incutir). A referência, além de mostrar a fonte em que bebe Peter (com o perdão do trocadilho), é também uma dica do artista para a interpretação de seu trabalho. É como se o artista traçasse um paralelo entre a arte e a grife: o que levou a assinatura de Duchamp é arte, por que assim ele definiu com sua incrível visão de mundo. O que leva a logomarca de uma grife, é chique, elegante e requintado, por que alguém assim definiu, não necessariamente por ser. Assim como muitos podem questionar se o que Duchamp faz é arte, muitos podem questionar o que é um objeto de grife, pois a qualidade não está necessariamente no objeto, mas no conjunto de valores que se atribuem ao objeto. No fim, a sensação que temos da obra de Peter é que não importa se é original ou falsificação, é tudo uma questão de propaganda e de fazer acreditar.

Peter de Brito - de 13 de agosto a 4 de outubro
Visitação: de quarta-feira a sábado, das 16h às 20h
Galeria Emma Thomas: Rua Augusta, 2052, cj 03 - Cerqueira César

Por Gustavo Vinagre

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